Capítulo 1 - Cativeiro e Pureza

A brisa morna da fazenda Almeida soprava suavemente entre as folhas das mangueiras, espalhando pelo ar o doce aroma das frutas maduras. O sol, alto no céu, banhava a terra fértil com sua luz dourada, mas para Isaura, aquele brilho jamais significara liberdade.

Desde o nascimento, Isaura vivera entre a senzala e a casa-grande, pertencendo ao Comendador Almeida, que, por compaixão e apreço, dera-lhe uma criação diferente dos outros escravos. Joaquina, uma bondosa mulher que sempre a tratara como filha, ensinara-lhe os primeiros passos da vida. Depois, a esposa do Comendador, admirada por sua beleza e inteligência, cuidou de sua educação com esmero, tornando-a instruída, delicada e virtuosa. Mas nenhum gesto de gentileza poderia apagar a verdade cruel: Isaura era uma escrava.

A jovem possuía a pele alva como a de qualquer sinhá, os cabelos castanhos ondulados emolduravam seu rosto delicado, e seus olhos, de um brilho doce e melancólico, guardavam a tristeza de um destino que não podia mudar. Em sua essência, carregava a bondade e a resignação de quem nascera para servir, mas em seu íntimo, o desejo pela liberdade ardia como uma chama oculta.

Por anos, Isaura vivera sob a proteção da Comendadora, que, enquanto viva, jamais permitiu que alguém lhe fizesse mal. Mas a morte da senhora selara seu destino de vez. Comendador Almeida, já velho e cansado, pouco se importava com o que acontecia na fazenda. O verdadeiro perigo estava em seu filho, Leôncio.

Desde que retornara da cidade, Leôncio não escondia sua obsessão por Isaura. Rico e acostumado a ter tudo o que desejava, ele a via não como uma pessoa, mas como uma posse preciosa, uma joia que lhe pertencia por direito. Buscava-a nos corredores da casa, forçava-lhe olhares insinuantes e palavras que faziam a jovem estremecer de medo.

Isaura evitava-o sempre que podia, refugiando-se no jardim ou ajudando Joaquina na cozinha, onde o ar quente e o cheiro do feijão cozido pareciam ser sua única proteção. Mas o olhar de Leôncio estava em toda parte.

Numa tarde silenciosa, ele a encontrou sozinha junto à fonte, onde lavava as mãos depois de cuidar das plantas. Aproximou-se sorrateiramente, e, antes que pudesse fugir, segurou-a pelo pulso com firmeza.

— Para que foges de mim, Isaura? — sua voz era mansa, mas carregava um tom ameaçador. — Sabes que não podes escapar do teu senhor.

O coração da jovem bateu forte. Ela tentou puxar a mão, mas ele apertou ainda mais.

— Solte-me, senhor Leôncio — pediu, com a voz trêmula.

— Por que finges que não me desejas? Tu não passas de uma escrava, Isaura. E és minha.

Os olhos dela se encheram de lágrimas, mas, com toda a dignidade que lhe restava, ergueu o rosto e disse:

— Meu corpo pode ser cativo, senhor, mas meu coração jamais lhe pertencerá.

Leôncio soltou-a com um riso irônico, mas em seu olhar havia um brilho sombrio de quem não desistiria tão fácil. Isaura correu para dentro da casa, sufocando o choro que ameaçava escapar.

Nessa noite, enquanto olhava pela pequena janela de seu quarto, viu o céu estrelado e pensou que, em algum lugar além daquela fazenda, a liberdade a esperava. Mas como alcançá-la? Seu pai, Miguel, ainda juntava dinheiro para comprar sua alforria, mas e se nunca conseguisse? E se Leôncio, impaciente, resolvesse castigá-la de forma irreversível?

A escravidão era uma sombra que a perseguia, mas seu espírito continuava puro, intacto. Isaura não perderia a esperança, mesmo que a cada dia sua prisão se tornasse mais sufocante.