O relógio da sala marcava 09h42 da manhã quando o silêncio foi interrompido pela notificação no celular de Gustavo. Ele olhou a tela sem interesse, ainda tentando acordar, mas sentiu o estômago gelar ao ver a mensagem de um número desconhecido.
"Gabriel Silva foi encontrado morto hoje de manhã. A polícia investiga. Entraremos em contato com mais informações."
A notícia se espalhou rápido. No grupo dos cinco amigos, não houve piada, nem emoji, nem resposta imediata. O silêncio digital gritou mais alto do que qualquer palavra poderia.
Horas depois, os quatro restantes — Henrique, Luís, Renato e Gustavo — estavam sentados na casa de Renato. A televisão ligada no volume baixo repetia as imagens do corpo sendo retirado de uma área de mata próxima à zona sul da cidade. Nenhum deles olhava diretamente para a tela.
A casa de Renato tinha cheiro de café requentado e madeira molhada. As cortinas estavam abertas, mas a luz do dia parecia não conseguir entrar. Renato andava de um lado para o outro, inquieto, mexendo na gola da camisa como se ela estivesse apertando o pescoço. Luís tentava manter as mãos ocupadas, mas sua perna tremia incontrolavelmente. Henrique, de braços cruzados, estava encostado na parede, encarando os sapatos. Gustavo parecia mais calmo — ou anestesiado.
— Não faz sentido… — disse Luís, acendendo um cigarro com as mãos trêmulas. — Ele tava bem. A gente se falou ontem à noite.
— E falou o quê? — perguntou Henrique, sem disfarçar o tom agressivo.
— Só coisa boba… Coisa de sempre. Ele tava rindo. Me zoando por causa da camisa do Flamengo.
Henrique bufou.
— Não é possível, cara. Não é possível que isso aconteceu.
Renato parou perto da janela, observando a rua vazia. As folhas secas voavam com o vento leve da manhã.
— Ninguém é morto à toa… — comentou. — Alguém tinha motivo.
Um silêncio desconfortável se instalou. Os quatro sabiam que aquela frase carregava mais do que desabafo. Soava como acusação.
— Você tá insinuando o quê, Renato? — questionou Henrique, levantando o olhar.
— Nada. Só tô dizendo… — ele deu de ombros. — Que a polícia já tá tratando como suspeita de homicídio.
— Mas não disseram nada ainda — completou Gustavo, falando pela primeira vez. — Pode ter sido acidente. Assalto. Qualquer coisa.
— Ele foi encontrado com o rosto machucado, a carteira no bolso e o celular ao lado do corpo. Isso não parece assalto. Parece execução. — Renato falou com firmeza, como se já tivesse investigado ele mesmo.
— Então a gente vai fazer o quê? Jogar um jogo de detetive agora? — disse Henrique, ironizando. — Ficar se olhando e pensando quem é o assassino?
— Talvez a gente devesse. — murmurou Luís. — Tem coisa errada aqui. E vocês sabem.
Ninguém respondeu. O tempo se alongou, pesado como concreto. Cada um parecia engolido por seus próprios pensamentos.
Gustavo levantou e foi até a cozinha, alegando sede. Mas ninguém acreditou que fosse só isso. Renato permaneceu de pé, imóvel, encarando o nada. Henrique fechou os punhos, como se estivesse pronto para quebrar algo — ou alguém. Luís puxou mais uma tragada do cigarro, que tremia em seus dedos.
A morte de Gabriel não era só uma tragédia. Era um estopim.
E alguém naquela sala sabia mais do que estava dizendo.