No dia 26 de abril de 1965, o Rio de Janeiro testemunhou o início de uma revolução silenciosa na comunicação brasileira. Às 19 horas, a TV Globo entrou no ar pelo canal 4, transmitindo sua primeira imagem: uma vinheta simples, seguida pelo programa "Tele Globo", um noticiário apresentado por Hilton Gomes. Era o embrião de uma emissora que, em poucos anos, se tornaria um colosso da televisão no Brasil. Fundada por Roberto Marinho, um jornalista e empresário que já comandava o jornal O Globo desde 1925, a TV Globo surgiu em um momento de efervescência tecnológica e política, carregando consigo a ambição de transformar a jovem indústria televisiva do país.
O Brasil da década de 1960 vivia os primeiros passos da televisão, iniciados em 1950 com a TV Tupi de Assis Chateaubriand. Quando a Globo estreou, o mercado já contava com concorrentes estabelecidos, como a própria Tupi e a TV Excelsior, que dominavam a audiência com programas populares e as primeiras telenovelas. A TV Globo, no entanto, enfrentou um começo modesto. Seus estúdios na Rua Von Martius, no bairro do Jardim Botânico, eram pequenos, e a infraestrutura técnica era limitada. A programação inicial refletia essa simplicidade: além do "Tele Globo", havia o infantil "Uni Duni Tê", apresentado por Célia Helena, e a novela "Ilusões Perdidas", escrita por Enoch Dantas, que tentava atrair um público ainda acostumado às produções da Excelsior.
Os primeiros anos foram de desafios. Em 1966, um incêndio devastou parte das instalações da emissora, forçando Roberto Marinho a buscar apoio financeiro e estratégico. Foi nesse contexto que a Globo firmou uma parceria com o grupo americano Time-Life, uma decisão controversa que trouxe capital e know-how técnico, mas também levantou críticas por suposta interferência estrangeira — algo proibido pela legislação brasileira da época. Apesar das polêmicas, o acordo foi crucial para modernizar a emissora, permitindo a aquisição de equipamentos e a expansão do sinal.
O cenário político também moldou os primeiros passos da Globo. Após o golpe militar de 1964, o Brasil vivia sob um regime autoritário que via na televisão um instrumento de unificação nacional. Roberto Marinho, alinhado aos interesses do governo, conseguiu concessões para ampliar a rede da emissora, conectando Rio de Janeiro, São Paulo e outras capitais por meio de retransmissoras. Esse suporte foi decisivo para que a Globo deixasse de ser uma emissora local e começasse a sonhar com uma escala nacional, algo que suas rivais, fragmentadas e mal financiadas, não conseguiram acompanhar.
A programação começou a ganhar forma com a chegada de profissionais talentosos. Walter Clark, diretor-geral a partir de 1965, trouxe uma visão inovadora, apostando em uma identidade visual marcante e em formatos que misturavam jornalismo, entretenimento e dramaturgia. Outro nome essencial foi Joe Wallach, um técnico americano que ajudou a implantar o "Padrão Globo de Qualidade", um conceito que, embora plenamente desenvolvido nas décadas seguintes, já despontava como diferencial na precisão técnica das transmissões.
Em 1968, a Globo deu um salto ao adquirir a TV Paulista, canal 5 de São Paulo, consolidando sua presença no maior mercado do país. No mesmo ano, o programa "Jornal Hoje" estreou, e a novela "A Grande Família" — não confundir com a série homônima de 2001 — começou a testar o formato de dramaturgia que faria história. A audiência crescia, mas ainda era tímida diante da concorrência. A Tupi exibia "Beto Rockfeller", uma novela revolucionária que abandonava o melodrama tradicional, enquanto a Excelsior se destacava com produções sofisticadas. A Globo, contudo, estava plantando as sementes de algo maior.
Ao fim de 1969, a emissora encerrava sua primeira meia década com um marco simbólico: a estreia do "Jornal Nacional", em 1º de setembro. Apresentado por Cid Moreira e Hilton Gomes, o telejornal foi o primeiro a ser transmitido em rede nacional, unindo o Brasil por meio de um único noticiário. Era o prenúncio de uma nova era, em que a Globo deixaria de ser apenas uma promessa para se tornar um império em construção.Esse período inicial, entre 1965 e 1969, foi de aprendizado e ousadia. Roberto Marinho, com sua determinação empresarial e faro jornalístico, lançou as bases de uma emissora que, embora ainda vulnerável, já exibia traços de sua futura grandiosidade. A TV Globo nascia em um Brasil dividido entre tradição e modernidade, repressão e esperança — e, nos anos seguintes, ela se tornaria não apenas espectadora, mas protagonista dessa história.