Capítulo 10 – O despertar

 O nascer do sol cortava o horizonte como uma lâmina alaranjada. Mas o céu, pesado e cinza, lembrava ao grupo que o fim ainda estava longe.

Antônio ajustava o coldre em silêncio. O rosto envelhecido em poucos meses, os olhos secos — ele não chorava mais. Não havia mais tempo para lágrimas.

— A entrada principal estará bloqueada — informou Dehr, com sua voz grave e calma. — Mas existe um túnel de drenagem. Foi por onde escapei, anos atrás.

JP assentiu, conectando os cabos finais ao protótipo alienígena adaptado.

— Quando conectarmos isso ao núcleo da torre, o sistema entrará em sobrecarga. Precisamos de apenas um minuto. Um minuto e tudo muda.

Rafael apertou a mão dele por baixo da mesa. Sem palavras. Eles sabiam o risco.

— E o Augusto? — perguntou Milena.

— Se ele estiver lá… vamos lidar com isso — disse Antônio, firme. — Eu vou lidar.

O túnel era apertado, molhado e escuro. Um cheiro metálico pairava no ar. À frente, Dehr liderava com passos silenciosos. O grupo seguiu, um por um, até emergirem em uma sala secundária dentro da torre.

Ali, ouviram vozes. Marchas. Passos programados.

— Dois minutos até o núcleo — sussurrou Laura, já empunhando a arma.

Mas quando atravessaram o corredor, ele estava ali.

Augusto.

Vestindo um uniforme escuro, ombreiras afiadas e olhos fundos. Mas vivos.

— Pai.

O mundo parou por um instante.

Antônio deu um passo à frente, a arma apontada para o chão.

— Filho. Sou eu. Você lembra?

Augusto franziu a testa. Era como ver um espelho rachado. Fragmentos de algo antigo tentando emergir.

— Você... deixou a porta do galinheiro aberta. Os cachorros correram a noite inteira... — murmurou ele, hesitante.

Milena engasgou com o choro. Rafael se emocionou. Antônio sorriu, pequeno.

— Isso mesmo. E você chorou quando o galo fugiu.

Augusto fechou os olhos. O corpo tremia. Por um segundo, pareceu levantar a arma. Mas ao abri-los novamente, ele já não era o mesmo.

— Eu… eu não consigo lutar contra isso sozinho.

Antônio se aproximou.

— Não precisa. Estou aqui.

Augusto caiu de joelhos, ofegante, lutando contra o controle mental. No fundo do corredor, alarmes começaram a soar.

— Eles sabem — gritou JP. — Vamos agora!

Laura e David dispararam contra dois soldados chipados que surgiram. Rafael correu até o terminal.

— Augusto, você conhece esse lugar. Onde está o núcleo?

— Terceiro nível. Elevador travado. Mas há escadas pelos dutos de ventilação.

O grupo se dividiu. Enquanto Laura, David e Milena seguravam a retaguarda, JP, Rafael, Dehr, Antônio e Augusto avançaram pelos túneis até o coração da torre.

O núcleo pulsava como um coração artificial. Luzes vermelhas giravam em ciclos rápidos. Era o centro de tudo. O lugar onde a mente dos chipados era mantida sob controle.

JP se posicionou. Conectou o dispositivo. A contagem regressiva começou.

— 60 segundos — anunciou.

Mas os inimigos chegaram antes.

Três soldados chipados surgiram, armados e impiedosos. Um deles disparou contra Rafael, que caiu ferido no ombro. JP gritou. Dehr avançou, abrindo caminho com uma arma de energia.

Foi então que Augusto se ergueu.

— Eu seguro eles. Vão! — berrou ele.

— Não! — gritou Antônio.

— Pai, me deixe fazer algo certo. Só uma vez.

E então ele correu para o meio dos soldados, desviando, derrubando dois deles. Um golpe o atingiu no peito. Mas ele não parou.

A contagem chegou ao fim.

3... 2... 1...

Um clarão se espalhou por todo o ambiente. O núcleo entrou em colapso. A torre tremeu.

Lá fora, milhares de pessoas caíram de joelhos. Os chips em suas nucas brilharam — e se apagaram.

Laura viu o momento exato em que os olhos do inimigo à sua frente mudaram. De ferozes para confusos. Ele deixou cair a arma.

— Onde… onde eu estou?

Horas depois, entre escombros e fumaça, o grupo se reuniu do lado de fora da torre, agora destruída. Milhares de libertos caminhavam pelo campo, desorientados. A humanidade respirava de novo.

Mas Augusto não estava ali.

Antônio o encontrou nos destroços, ainda vivo, mas desacordado.

— Ele salvou a gente — disse Rafael, ajoelhado ao lado do corpo.

Antônio apertou a mão do filho.

— Você voltou. E agora, a gente vai te trazer de volta por inteiro.

Dehr olhou para o céu, agora tingido de um azul acinzentado.

— A guerra ainda não acabou. Mas agora, vocês têm uma chance real.

JP olhou ao redor, os olhos marejados, mas com um leve sorriso.

— É só o começo.

Milena tocou o ombro de Laura.

— Estamos começando a recuperar a Terra.

Laura respirou fundo, pegando um transmissor.

— Aos que ainda resistem... a torre caiu. Os chips caíram. Vocês estão livres. E não estão sozinhos.

A voz dela ecoou pelos rádios do mundo. E mesmo entre os destroços, entre os corpos e as ruínas, algo novo nascia.

Esperança.