Capítulo 2: Antonela e o Começo do Fim

 A primeira vez que vi Antonela, parecia que o mundo tinha dado uma pausa só pra gente. Sabe quando alguém entra num lugar e, do nada, tudo ao redor perde a importância? Pois é, foi exatamente assim. Ela entrou na oficina com aquele jeito meio apressado, falando ao telefone e, de alguma forma, mesmo no meio do caos, conseguiu roubar minha atenção. Cabelos castanhos ondulados, olhos que pareciam sempre analisar o mundo ao redor, e um sorriso que... bem, aquele sorriso.

Naquela época, eu não sabia que a oficina e a "Salva" iam ser motivo de tantos problemas entre nós. Quando começamos a sair, tudo era novo, leve. Era fácil estar com ela, conversar, rir. Eu levava Antonela para dar umas voltas de saveiro nas noites de verão, com as janelas abertas e o vento bagunçando o cabelo dela. Ela adorava. Pelo menos no início.

Lembro de um fim de semana que fomos a uma praia perto da cidade. Carreguei a "Salva" com nossas coisas e caímos na estrada, só eu, Antonela e a música tocando. Naquele momento, parecia que nada poderia dar errado. Ela me olhava como se eu fosse o cara mais incrível do mundo, e eu acreditava que, com ela, poderia enfrentar qualquer coisa.

Mas a gente sabe que a vida tem um jeito meio cruel de mudar tudo, né? Aos poucos, as diferenças começaram a aparecer. Não era nada grandioso no começo. Só umas piadinhas sobre o tempo que eu passava na oficina, sobre como eu estava "sempre com a cabeça nos carros". Eu ria, achando que era só implicância leve. Mas a verdade é que isso incomodava Antonela. Ela queria mais de mim, queria que eu estivesse mais presente, e menos... bem, menos na oficina.

Lá pela metade do relacionamento, as piadinhas viraram discussões. Ela dizia que eu não tinha ambição, que a vida era mais do que ficar sujando as mãos de graxa. Eu tentava explicar, em vão, que não era só sobre carros, era sobre a paixão, sobre a conexão que eu tinha com aquilo. Mas ela nunca entendeu completamente. Não era que Antonela não gostasse de mim, ou que eu não gostasse dela. Acho que, na verdade, o problema era que a gente estava tentando se encaixar em vidas que não combinavam.

Cheguei a pensar, por um tempo, que poderia equilibrar as duas coisas: ela e a oficina, ela e a "Salva". Tentei de tudo para agradar, saí mais cedo do trabalho, levei ela para jantar em lugares que eu nem gostava tanto, deixei a saveiro parada no final de semana. Mas a verdade é que, quanto mais eu tentava, mais parecia que a distância entre nós crescia.

Antonela começou a falar sobre planos de vida que não incluíam uma oficina. Falava sobre viagens longas, mudança de cidade, cursos e trabalhos dos quais eu nunca tinha ouvido falar. Eu escutava, tentando me encaixar nos sonhos dela, mas a cada conversa, percebia que meus sonhos estavam ficando para trás. E aí, quando eu finalmente comecei a me dar conta de que estava perdendo uma parte de mim, ela já tinha se afastado de vez.

Foi numa dessas conversas, num fim de tarde, que tudo desmoronou. Ela olhou para mim e perguntou, quase num tom de frustração: "Você nunca vai querer mais do que isso, não é? Só a oficina e esses carros rebaixados?".

A pergunta me atingiu de um jeito que eu não esperava. Porque, para mim, a oficina e os carros eram o "mais". Eles sempre foram. Mas para ela, eram o "menos". E foi nesse momento que eu percebi que talvez a gente nunca estivesse no mesmo caminho.

O fim não foi explosivo. Não houve gritos ou portas batendo. Foi uma conversa dolorosa, mas calma. Ela disse que queria algo diferente, algo maior, e eu não podia prometer que seria aquele cara. Eu sabia que não poderia deixar de ser quem eu era, nem parar de fazer o que amava. Foi aí que tudo terminou.

Nos primeiros dias, senti como se tivessem arrancado uma parte de mim. Olhar para a saveiro me lembrava dela, e ao mesmo tempo, me lembrava de quem eu sou. Era estranho. Como se a "Salva", que sempre tinha sido minha companheira, agora fosse um lembrete do que eu não pude dar a Antonela. Mas, com o tempo, percebi que talvez a verdadeira questão fosse que nunca deveríamos ter tentado mudar um ao outro.

Hoje, quando penso nela, não sinto raiva. Sinto uma certa tristeza, mas não arrependimento. Antonela me ensinou muito. Me ensinou que às vezes amar alguém significa deixar essa pessoa seguir o próprio caminho. E me ensinou, também, que não importa o quanto você ame alguém, se não houver espaço para quem você realmente é, o amor não é suficiente.

Então, a "Salva" continua aqui, firme e forte, como sempre. Ela e eu, prontos para a próxima curva, para a próxima estrada. E quanto à Antonela? Bem, ela foi uma parte importante do caminho, mas agora, seguimos por estradas diferentes.

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