Viver nos anos 70 era caminhar entre dois mundos: um país sob o silêncio da censura e uma juventude que começava a gritar por liberdade com roupas coloridas, cabelos volumosos e ideias em ebulição. A década foi marcada por uma série de contrastes — enquanto o regime militar impunha seus limites com rigidez, a arte, a música e a moda respondiam com ousadia, resistência e criatividade. O Brasil vivia dias de repressão política, mas também de uma explosão cultural que usava a linguagem simbólica como forma de escapar dos olhos da censura.
Na moda, tudo chamava atenção: as calças boca de sino dominavam as ruas, junto com coletes, cintos largos, camisas de gola grande e estampas psicodélicas que pareciam saídas de um sonho colorido. A influência do movimento hippie, que pregava paz, amor e liberdade, chegava com força no visual e no comportamento. Jovens usavam cabelos compridos, colares artesanais, óculos redondos e faziam de praças e festivais os seus refúgios. Era o tempo da autodescoberta, da busca por novas formas de expressão e da contestação dos padrões.
Na alimentação, o cardápio ainda era majoritariamente caseiro. As refeições do dia a dia seguiam a tradição com arroz, feijão, carnes variadas e legumes. Mas a novidade começava a espreitar: as redes de fast food davam seus primeiros passos no país e o conceito de comer fora de casa ganhava espaço, sobretudo nas cidades grandes. Refrigerantes se popularizavam e doces industrializados começavam a disputar lugar nas lancheiras escolares, que ainda carregavam pão com manteiga embrulhado em papel alumínio.
A rotina dos adolescentes mudava: já não bastava estudar e obedecer — era preciso pertencer a um grupo, ter uma identidade. Eles se reuniam para ouvir discos de vinil, comentar as últimas bandas de rock progressivo, falar de política ou simplesmente passar o tempo longe da vigilância dos pais. Começavam a surgir as primeiras festas com luzes coloridas e sons amplificados, os bailinhos de garagem e as turmas que marcavam encontros nos centros urbanos. Já os adultos encontravam na televisão um consolo diante da instabilidade política. A TV Globo consolidava seu domínio com novelas como Irmãos Coragem, O Bem-Amado e Dancin’ Days, que misturavam crítica social, emoção e uma estética marcante.
No cinema, os efeitos especiais surpreendiam. Filmes como Tubarão e Guerra nas Estrelas mostravam que o mundo estava mudando, e o impacto visual era tão forte que o público saía das salas de cinema boquiaberto. A produção nacional também resistia: o cinema brasileiro usava da metáfora para driblar a censura e falar, de forma poética ou escancarada, das mazelas do país. O rádio ainda era importante, principalmente para ouvir músicas e programas populares, mas já dividia espaço com a televisão, que agora reinava no centro da sala como símbolo de status e modernidade.
Os anos 70 foram, enfim, uma década de transição. A tecnologia ainda era analógica, mas as transformações já anunciavam o mundo digital. Os valores conservadores resistiam, mas a juventude mostrava que o futuro seria outro. Viver nos anos 70 era estar entre o medo e a criatividade, entre o silêncio imposto e o som alto dos festivais, entre o preto e branco da política e o technicolor da cultura. Era dançar com cuidado, mas dançar — e fazer da arte uma forma de respirar.