Adriano, o diretor da escola, era um homem que levava a seriedade a um nível quase cômico. Sempre de terno, gravata impecável e expressão severa, ele se orgulhava de ser o pilar da ordem na escola. Mas, o que ninguém sabia, era que o coração de Adriano batia forte por alguém. E esse alguém era ninguém menos que Pilar, a professora de química que fazia o caos parecer encantador.
Adriano não sabia bem como demonstrar seu interesse. Sendo ele um homem "intelectual", decidiu que a melhor forma de impressionar Pilar era mostrando sua vasta cultura – ou, pelo menos, o que ele achava ser cultura. Por isso, naquela manhã, tomou uma decisão corajosa: convidaria Pilar para um café em sua sala, onde poderia falar sobre temas "sofisticados".
Na hora do intervalo, Pilar caminhava pelos corredores com sua pasta cheia de provas para corrigir, quando Adriano apareceu. Ele estava visivelmente nervoso, ajeitando o nó da gravata, e aproximou-se com uma postura rígida.
— Professora Pilar, bom dia. Gostaria de conversar sobre... assuntos pedagógicos importantes. Que tal um café em minha sala? — disse ele, tentando soar casual, mas com o tom mais formal possível.
Pilar, sempre gentil, sorriu.
— Claro, diretor Adriano. Eu tenho alguns minutos antes da próxima aula.
Adriano ficou surpreso com a resposta positiva. É agora, pensou. Hora de impressioná-la com meu vasto conhecimento filosófico.
Na sala do diretor, Adriano serviu o café, todo cuidadoso para não derramar nada, e sentou-se em sua cadeira, cruzando as pernas de forma exageradamente formal.
— Pilar... — Ele fez uma pausa, ajeitando os óculos. — Você já ouviu falar de Sócrates de Melo? Um filósofo muito... interessante.
Pilar arqueou uma sobrancelha, claramente confusa, mas sorriu educadamente.
— Sócrates de Melo? Não estou lembrada... Ele escreveu sobre o quê?
Adriano, sem perceber a expressão de dúvida de Pilar, continuou, inflando o peito.
— Ah, sim. Ele era um grande pensador... Ele falava sobre a transmutação da alma e o ciclo das existências. Algo como uma mistura de... Platão e o filósofo Zé da Silva. Muito profundo, sabe?
Pilar, agora visivelmente tentando conter o riso, assentiu.
— Ah, sim... Claro... Transmutação da alma. Profundo, de fato.
Adriano continuava, sem perceber que estava falando coisas sem o menor sentido.
— E, claro, não podemos esquecer o grande Aristóteles... Magalhães. Outro pensador que definiu os pilares da ética como... algo que transcende a moralidade humana e se conecta com o cosmos.
Pilar agora mordia o lábio para não rir. Ela não sabia se Adriano estava falando sério ou se era uma piada elaborada. Mas, como sempre, manteve o sorriso.
— Interessante, diretor Adriano. Nunca tinha ouvido falar desses... pensadores.
Adriano, achando que estava arrasando, sentiu-se confiante para continuar.
— Eu tento trazer esses conceitos filosóficos para o ambiente escolar, entende? Como Sócrates de Melo dizia: "A educação é o fogo que acende a vela do conhecimento, mas cuidado com o vento que apaga o fósforo".
Pilar piscou, perplexa, sem saber se aquilo era uma metáfora confusa ou pura invenção.
— Nossa... muito profundo mesmo.
No meio dessa conversa estranhamente filosófica, um som alto veio da mesa de Adriano. Ele, nervoso, acidentalmente derrubou uma pilha de papéis que voaram por todo o escritório. Tentando desesperadamente recolher tudo, ele tropeçou na própria cadeira e quase caiu. Pilar, educada como sempre, levantou-se para ajudar, embora estivesse visivelmente divertida com a situação.
— Oh, meu Deus, desculpe-me! — exclamou Adriano, vermelho de vergonha.
— Não se preocupe, diretor. Acontece — disse Pilar, recolhendo alguns papéis, ainda sorrindo.
Quando os papéis finalmente estavam de volta à mesa, Adriano, completamente desconcertado, tentou retomar o controle da situação.
— Bom, como eu estava dizendo... A filosofia é algo que guia nossas ações... E...
Pilar interrompeu gentilmente.
— Diretor, eu realmente preciso voltar para a sala agora. Mas foi uma conversa muito... esclarecedora.
Adriano, ainda confuso e um pouco desajeitado, apenas assentiu, tentando não parecer tão derrotado.
— Claro, claro. Obrigado pelo seu tempo, Pilar. Foi... filosófico.
Enquanto Pilar saía da sala, ele respirou fundo, ajeitando os óculos novamente.
— Sócrates de Melo... — murmurou para si mesmo, sentindo-se um gênio incompreendido.
E assim, Adriano ficou sozinho, acreditando que havia causado uma boa impressão com sua "profundidade filosófica", sem nem desconfiar que Pilar estava rindo discretamente no corredor, achando tudo aquilo no mínimo curioso – e talvez um pouquinho encantador.