O café do MASP, com sua vista privilegiada para a Avenida Paulista, era o cenário perfeito para a encenação. Heron, impecável em uma camisa social, e Tadeu, um pouco mais nervoso, sentaram-se em uma mesa, observando as pessoas entrarem e saírem do museu. A ansiedade de Tadeu era palpável. Ele sabia que estavam prestes a pisar em um terreno perigoso.
— Relaxa, cara. A gente ensaiou. É só seguir o roteiro — Heron sussurrou, percebendo a tensão do amigo.
Tadeu assentiu, mas seu coração batia forte. Ele não era bom em mentir, mas, por Heron, faria o que fosse preciso. Minutos depois, Sabrina chegou. Alta, com um corte de cabelo elegante e um olhar que parecia analisar cada detalhe do ambiente. Ela se aproximou da mesa e estendeu a mão para Heron.
— Heron? Prazer. Sabrina. Agradeço por ter me procurado. Fiquei curiosa com a proposta.
— O prazer é todo meu, Sabrina. Este é meu sócio, Tadeu.
Eles se cumprimentaram, e o jogo começou. Heron, com sua voz calma e segura, começou a discorrer sobre uma galeria de arte fictícia, "Aether", e o desafio de modernizar sua segurança sem perder o toque artístico. Ele falava com uma fluidez impressionante, citando artistas e tecnologias de ponta, deixando Sabrina genuinamente impressionada.
— Sua pesquisa é impressionante, Heron. Pessoas de arte raramente se aprofundam tanto na segurança. Você parece um especialista — ela comentou, tomando um gole de seu café.
Heron sorriu, um sorriso charmoso e calculado.
— A gente tenta. Mas para ser honesto, por mais que a gente estude, o que eu realmente preciso é da sua experiência. Especialmente em lidar com um local com circulação constante de pessoas. Algo como um museu.
A palavra "museu" fez o olhar de Sabrina mudar. Um brilho de desconfiança apareceu em seus olhos, mas ela não demonstrou.
— Entendo. O que você quer saber exatamente?
— Em um lugar como o MASP, por exemplo, onde a arquitetura é tão particular, como o sistema de vigilância se integra ao projeto? O piso de vidro da galeria de exposições, por exemplo, deve ser um pesadelo para câmeras e sensores de movimento.
A pergunta de Heron era específica demais para um consultor de arte. A semente da dúvida havia sido plantada. Sabrina, no entanto, decidiu testá-lo. Ela se recostou na cadeira, com um olhar mais sério.
— Você tem razão. O piso de vidro é um grande desafio. Ele é dividido em zonas de sensores de pressão e câmeras térmicas. O monitoramento não é apenas visual, é físico e invisível. Qualquer passo em falso, qualquer movimento diferente, e o alarme é disparado para a sala de controle.
Heron escutava atentamente, absorvendo cada palavra. Tadeu, por outro lado, tentava parecer interessado no menu, mas sua orelha estava em cada detalhe da conversa.
— E as salas de exposição temporária? Como a sala da Ocean Blue? A segurança lá é ainda maior, eu imagino.
A voz de Heron era casual, mas a tensão na mesa aumentou. O nome da joia. A sala exata. Sabrina o olhou diretamente, seu olhar penetrante.
— Senhor Heron, para uma pessoa que precisa de consultoria para uma galeria de arte fictícia, você sabe detalhes demais sobre a segurança do MASP.
Heron não se abalou. Ele manteve a calma, encarando-a com uma honestidade forçada.
— Como eu disse, minha pesquisa é minuciosa. Eu me interesso por segurança. Eu admiro o seu trabalho.
Sabrina suspirou, um sorriso tênue em seus lábios. Ela não estava convencida, mas estava intrigada. A inteligência de Heron era inegável.
— O cofre da sala da Ocean Blue não está no mesmo circuito que o restante do museu. Ele possui um sistema de segurança independente, alimentado por um gerador próprio. Uma tentativa de corte de energia acionaria a trava, e o cofre só abriria com a biometria de três pessoas da equipe sênior. É um sistema à prova de falhas.
Heron sorriu, um sorriso pequeno e vitorioso. Ele havia conseguido a informação que precisava. Ele sabia que ela desconfiava, mas também sabia que ela jamais imaginaria que ele estava planejando algo tão audacioso. Eles se despediram com formalidade.
Ao se afastar, Sabrina não tirava os olhos de Heron, sua mente trabalhando para entender o motivo daquelas perguntas. Ela sabia que algo estava errado. A fachada de consultor de arte não a convenceu. E a semente da desconfiança, plantada com sucesso, cresceria e se tornaria um obstáculo no futuro.
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