Leonardo sempre se orgulhara de conhecer a irmã melhor do que ninguém. Cresceram juntos, dividiram segredos de infância, confidências inocentes que pareciam fortalecer uma cumplicidade inabalável. Por isso, nos últimos tempos, o comportamento de Laura lhe parecia estranho demais para ser apenas coincidência.
Ele começou a reparar nos detalhes. As mensagens que ela recebia e respondia rápido demais, como se tivesse medo de perder algum momento importante. As desculpas repetidas sobre compromissos na faculdade, sempre no mesmo horário, quase sempre no mesmo tom ensaiado. E o que mais chamava atenção: o jeito como Higor mudava de assunto quando o nome dela surgia em uma conversa qualquer.
Era um incômodo silencioso, que crescia dentro dele como uma pulga atrás da orelha.
Naquela noite de sexta-feira, os três estavam à mesa para o jantar. A mãe tinha saído para visitar uma tia e o pai ainda não tinha voltado do trabalho, então o ambiente parecia tranquilo demais para o turbilhão que Leonardo carregava na mente.
Ele observava discretamente enquanto Laura mexia no prato, distraída, e Higor fingia estar mais interessado no celular do que na comida. O clima estava comum demais, mas, para Leonardo, cada gesto tinha peso.
Respirou fundo e resolveu testar o terreno.
— Você tem saído bastante ultimamente, Laura… — disse de repente, sem disfarçar a curiosidade na voz. — Tá conhecendo alguém?
A reação dela foi imediata. Tossiu, quase engasgando com a comida, e levou alguns segundos para recuperar a naturalidade.
— Não… claro que não. É só estudo.
A resposta veio rápida demais, o olhar dela não encontrou o dele, e isso foi suficiente para acender ainda mais as suspeitas.
Leonardo desviou os olhos para Higor. O amigo, que até então estava com o celular na mão, deixou o aparelho de lado e apenas empurrou o garfo no prato, sem comentar nada. A expressão dele estava controlada demais, como quem se esforça para não ser notado.
Um silêncio incômodo tomou conta da mesa. O barulho dos talheres parecia mais alto que o normal.
— É, faculdade dá trabalho mesmo — Leonardo comentou, fingindo naturalidade. Mas por dentro, estava atento a cada detalhe.
Laura forçou um sorriso e voltou a mexer na comida, mas não conseguiu relaxar. Higor manteve-se quieto, quase imóvel, como se qualquer palavra fosse comprometer mais do que deveria.
Depois do jantar, quando Laura se levantou dizendo que precisava revisar uns textos, Leonardo ficou sozinho com Higor na cozinha. O amigo começou a recolher os pratos, como se quisesse evitar a conversa. Mas Leonardo não deixou passar.
— Você anda estranho, sabia? — falou em tom baixo, observando cada reação.
Higor parou por um segundo, mas logo retomou o movimento, colocando o prato na pia.
— Estranho como?
Leonardo cruzou os braços.
— Sei lá… parece que evita falar algumas coisas quando a Laura tá por perto.
Higor soltou uma risada curta, tentando disfarçar.
— Você tá viajando, cara.
Mas o olhar rápido, desconfortável, foi suficiente para Leonardo perceber que havia algo escondido. Não insistiu naquele momento. Preferiu guardar a suspeita para si, para que amadurecesse.
Mais tarde, deitado na cama, ficou encarando o teto. As peças começavam a se encaixar na sua mente. Os olhares rápidos entre os dois, as desculpas esfarrapadas, a forma como Laura ficava sempre na defensiva quando perguntava sobre sua vida.
Naquele instante, Leonardo jurou para si mesmo que não descansaria até descobrir a verdade. Se havia um segredo sendo escondido debaixo do seu próprio teto, ele faria questão de revelar.
E, no fundo, um sentimento de traição já começava a nascer dentro dele, ainda sem provas, mas carregado de uma certeza incômoda.
