Capítulo 4 – Amores Tensos

 A chuva caía fina sobre Curitiba, o tipo que não molha de uma vez, mas vai encharcando aos poucos, como uma tristeza que ninguém percebe até ser tarde.

O salão do evento era simples, mas bem iluminado. Aline havia organizado tudo para arrecadar fundos para um abrigo de animais, e fez questão de incluir uma apresentação musical. Fez mais questão ainda de chamar Gustavo.

"Cuidar dos animais é reconhecer que toda forma de vida merece respeito e proteção. Eles sentem, sofrem e amam, assim como nós. Defender a causa animal é lutar por um mundo mais justo, onde compaixão e responsabilidade caminham juntas. Nossa humanidade se mede também pela forma como tratamos os mais vulneráveis — e os animais estão entre eles."

Ele apareceu com o violão nas costas e o rosto cansado. Tocou algumas canções suaves, entre sorrisos tímidos e aplausos discretos. Quando terminou, se afastou da multidão e foi se abrigar num canto, longe da confusão.

Aline o seguiu.

— Tocou bem — disse, encostando no parapeito ao lado dele.

— Obrigado. É o meu trabalho, não é? — Terminou dando um sorriso.

O silêncio ficou entre eles por alguns segundos. Lá fora, a chuva engrossava. Dentro dele, também.

Aline respirou fundo. Os olhos dela estavam vermelhos — talvez pela bebida, talvez por tudo que guardava.

— Eu nunca te pedi nada, Gustavo. Mas pelo menos me olha.

Ele virou o rosto, surpreso.

— Aline...

— Eu gosto de você. Desde sempre. E você sabe. Eu vejo como você olha pro Augusto, mas ele não te entende como eu. Eu tô aqui. Eu nunca te feri. Eu estou pronta para você. Eu me preocupo, eu te trato bem, eu tenho contatos...

Gustavo se afastou um passo, desconcertado.

— Você é importante, Aline. Mas... mas não desse jeito. Eu sinto... por ele. Mesmo sem saber o que fazer com isso.

Ela tentou segurar o choro, mas os olhos denunciaram.

— Então por que vive fugindo dele?

— Porque eu tenho medo. Medo de amar alguém e não aguentar se perder de novo.

Aline balançou a cabeça, decepcionada.

— Você não tem medo de amar. Tem medo de ser feliz.

Antes que ele pudesse responder, Bruno apareceu. Tinha visto a cena de longe e se aproximou com o sangue quente.

— Tá de sacanagem, Aline?

— Isso não é da tua conta, Bruno. Deixa a gente em paz!

— Claro que é! Tu tá tentando confundir um cara que já vive em frangalhos. Isso é egoísmo puro.

— Ah, por que você é o protetor oficial agora?

— Não. Eu sou amigo de verdade. E amigo não se aproveita da bagunça dos outros pra ganhar espaço.

Aline chegou perto de Bruno e falou, quase que em sílabas:

— O Gus-ta-vo não vai te co-mer. Nun-ca!

Aline virou as costas, irritada. Bruno olhou pra Gustavo.

— Tu tá bem?

Gustavo não respondeu. Estava olhando pro outro lado do salão.

Lá, parado na entrada, debaixo do toldo molhado, estava Augusto. Tinha os olhos fixos nele e em Aline, a expressão fechada. Não precisou dizer nada. Não precisava. O mal-entendido já estava feito.

Augusto se virou e foi embora antes que Gustavo conseguisse reagir.

Tudo ao redor parecia desmoronar devagar. Gustavo sentia as paredes se fechando: a culpa, o medo, as escolhas que adiava, as verdades que não queria encarar.

Ele saiu do evento sem se despedir. Caminhou pela calçada molhada, o violão nas costas e o coração nas mãos.

Estava perdendo o que nem teve coragem de assumir.