Os anos 1980 foram um divisor de águas para a TV Globo. Após construir alicerces sólidos nas décadas anteriores, a emissora entrou em uma fase de expansão sem precedentes, consolidando-se como líder absoluta no mercado brasileiro e começando a projetar sua influência além das fronteiras nacionais. Foi uma era de modernização tecnológica, diversificação da programação e resposta à concorrência crescente, marcada por produções grandiosas e pela capacidade de se reinventar em um Brasil que emergia da ditadura rumo à redemocratização. Entre 1980 e 1989, a Globo não apenas dominou a televisão; ela se tornou sinônimo dela.
A teledramaturgia continuou sendo o carro-chefe da emissora, alcançando novos patamares de ousadia e sofisticação. Em 1985, "Roque Santeiro", escrita por Dias Gomes e Aguinaldo Silva, finalmente chegou às telas após uma década de censura. Com José Wilker no papel do mítico Roque e Regina Duarte como a viúva Porcina, a novela satirizava o poder e a religiosidade popular, alcançando picos de audiência superiores a 90%. No ano seguinte, "Selva de Pedra" ganhou um remake que atualizou a trama urbana de Janete Clair, enquanto "Vale Tudo" (1988), de Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Bassères, encerrou a década com uma crítica feroz à corrupção e ao "jeitinho brasileiro". A vilã Odete Roitman, interpretada por Beatriz Segall, tornou-se um ícone cultural, assassinada em um dos finais mais comentados da história da TV.
A tecnologia foi uma aliada crucial nessa expansão. A Globo já havia adotado a TV a cores na década anterior, mas nos anos 1980 aprimorou suas transmissões com o uso intensivo de satélites, como o Brasilsat A1, lançado em 1985. Isso permitiu que a emissora chegasse aos rincões mais remotos do país, unificando a programação em uma rede de mais de 100 afiliadas. A qualidade das produções também evoluiu, com cenários realistas e externas gravadas em locações como o Pantanal — cenário de "Sinhá Moça" (1986) —, que trouxeram um novo fôlego visual às novelas.
A concorrência, no entanto, exigiu que a Globo diversificasse sua grade. O SBT, fundado por Silvio Santos em 1981, desafiava a hegemonia da emissora com programas de auditório acessíveis e carismáticos. Chacrinha, o "Velho Guerreiro", migrou para a Globo em 1982 com o "Cassino do Chacrinha", trazendo seu estilo caótico e popular para competir diretamente com Silvio. Em 1989, Fausto Silva estreou o "Domingão do Faustão", um programa de variedades que rapidamente se tornou um fenômeno dominical, combinando música, entrevistas e quadros como a "Dança dos Famosos". Esses investimentos em entretenimento mostraram a versatilidade da Globo, que não se contentava em reinar apenas nas novelas.
O jornalismo também ganhou destaque, refletindo a transição democrática. Após as críticas pela cobertura tímida das "Diretas Já", a Globo ajustou sua postura. A morte de Tancredo Neves, em 1985, foi transmitida ao vivo por horas, com uma mobilização inédita que emocionou o país. O "Jornal Nacional", sob o comando de Cid Moreira e Sérgio Chapelin, tornou-se ainda mais central na vida brasileira, enquanto o "Globo Repórter" aprofundava investigações sobre temas como meio ambiente e desigualdade. A emissora começou a se posicionar como mediadora do processo político, culminando na cobertura da eleição de 1989, cujo debate entre Collor e Lula — editado de forma polêmica — marcou o fim da década.
A expansão internacional foi outro marco. Novelas como "O Rei do Gado" (embora de 1996, reflete o sucesso iniciado com "Escrava Isaura" nos anos 1970) e "Sinhá Moça" começaram a ser vendidas para dezenas de países, da Europa ao Oriente Médio. A Globo Internacional, lançada em caráter embrionário nos anos 1980, atendia comunidades brasileiras no exterior, enquanto coproduções com emissoras estrangeiras, como a portuguesa RTP, abriam novas frentes de negócios. Em 1989, a Globo já era reconhecida como uma das maiores exportadoras de conteúdo televisivo do mundo.
A infraestrutura da emissora acompanhou esse crescimento. O Projac (hoje Estúdios Globo), embora inaugurado oficialmente em 1995, começou a ser planejado nos anos 1980 como um complexo para centralizar as produções. Novas sedes em São Paulo e Recife reforçaram a presença regional, enquanto investimentos em tecnologia digital preparavam a Globo para o futuro. A receita publicitária disparava, alimentada por anunciantes que viam na emissora o canal mais eficaz para atingir milhões de consumidores.
A década, porém, não foi isenta de desafios. A Record tentava se reerguer, e o SBT conquistava público com novelas mexicanas e programas populares. A Globo respondeu com estratégias agressivas, como a compra de direitos esportivos — o futebol, com a transmissão do Brasileirão, tornou-se um trunfo — e a criação de minisséries como "Anos Dourados" (1986), que inovaram o formato dramático. Economicamente, o Brasil enfrentava inflação galopante e o Plano Cruzado, mas a Globo manteve-se resiliente, ajustando custos sem perder qualidade.
Ao fim de 1989, a Globo era um império consolidado. Sua audiência média ultrapassava 60% do mercado, e sua influência cultural era inquestionável. A emissora havia transformado a TV brasileira em um negócio de escala global, mas também em um reflexo da alma nacional — dos sonhos de consumo às tensões sociais. A década de expansão provou que a Globo podia crescer sem perder o controle, mas também plantou as sementes de uma concorrência que, nos anos seguintes, testaria sua supremacia. O Brasil mudava, e a Globo, mais uma vez, estava no centro dessa transformação.