O novo milênio trouxe à TV Globo uma missão clara: reconquistar um público jovem e diversificado em um cenário de mudanças tecnológicas e culturais aceleradas. Entre 2000 e 2009, a emissora abraçou os reality shows, um formato que explodia globalmente e prometia renovar sua conexão com os telespectadores. Foi uma década de experimentação, em que a Globo equilibrou sua tradição em teledramaturgia e jornalismo com a febre dos programas de confinamento e competição, enquanto lançava as bases para o futuro digital. A era dos reality shows redefiniu a relação da emissora com a audiência, provando que ela podia se adaptar sem perder sua essência.
O marco inaugural veio em 2002, com a estreia do "Big Brother Brasil" (BBB). Inspirado no formato holandês criado pela Endemol, o programa colocou 12 participantes confinados em uma casa sob vigilância 24 horas, competindo por um prêmio em dinheiro. Apresentado por Pedro Bial, o "BBB 1" foi um sucesso instantâneo, com Kléber Bambam vencendo a primeira edição e a final alcançando 50 pontos de audiência. A Globo apostou na interatividade, com votações por telefone e, mais tarde, pela internet, conectando-se a uma geração que buscava参与感 (participação) na TV. O "BBB" tornou-se um fenômeno anual, influenciando gírias, modas e até debates sociais, como a discussão sobre racismo em edições posteriores.
Antes do "BBB", a Globo já havia testado o gênero com "No Limite", lançado em 2000. Inspirado no americano "Survivor", o reality colocava participantes em desafios de sobrevivência em locais como o Ceará, apresentado por Zeca Camargo. Apesar do sucesso inicial, o programa perdeu força e saiu do ar em 2002, mas abriu caminho para o formato que dominaria a década. Outros experimentos, como "Fama" (2002), um reality musical, e "Casa dos Artistas" (embora do SBT, influenciou a Globo a explorar o filão), mostraram a versatilidade da emissora em adaptar tendências globais.
A teledramaturgia, embora ainda central, dividiu espaço com os realities. Novelas como "Laços de Família" (2000), de Manoel Carlos, e "Avenida Brasil" (embora de 2012, reflete o estilo urbano iniciado com "Celebridade" em 2003) mantiveram a Globo no topo do horário nobre. Porém, a audiência das novelas começou a declinar, pressionada por concorrentes como a Record, que investia em tramas bíblicas como "Os Dez Mandamentos" (fora deste recorte, mas iniciado nos anos 2000). A Globo respondeu com produções mais curtas e ousadas, como a minissérie "Cidade Invisível" (embora de 2021, segue a tendência de narrativas inovadoras).
O jornalismo enfrentou novos desafios na era da internet. O "Jornal Nacional", com William Bonner e Fátima Bernardes, manteve sua relevância, cobrindo eventos como os ataques de 11 de setembro de 2001 e a eleição de Lula em 2002. O "Fantástico" se reinventou com reportagens investigativas, enquanto a GloboNews ganhava espaço como canal de notícias 24 horas. A emissora também começou a digitalizar arquivos e experimentar plataformas online, como o G1, lançado em 2006, sinalizando os primeiros passos rumo ao streaming.
A concorrência se intensificou. A Record, com forte apoio financeiro da Igreja Universal, desafiava a Globo em horários nobres, enquanto o SBT apostava em formatos populares. A TV paga e a internet, com sites como YouTube (2005), fragmentavam ainda mais a audiência. A Globo respondeu com investimentos em esportes — como os Jogos Olímpicos de 2004 e 2008 — e parcerias com a SKY para oferecer conteúdo sob demanda. A transição para a TV digital, iniciada em 2007 no Brasil, foi outro marco, com a Globo liderando a adoção do sinal em alta definição.
Ao fim de 2009, a era dos reality shows havia transformado a Globo. O "BBB" estava em sua décima edição, consolidado como um dos programas mais lucrativos da emissora, enquanto "No Limite" retornava em 2009 com nova temporada. A audiência total da TV aberta caía, mas a Globo mantinha cerca de 40% do share, apoiada em sua capacidade de diversificar. A morte de Roberto Marinho, em 2003, marcou o início de uma gestão familiar mais estruturada, com seus filhos assumindo o comando e preparando a emissora para a revolução digital da década seguinte. O Brasil dos anos 2000 era conectado, jovem e exigente — e a Globo, com os realities, encontrou um caminho para dialogar com ele.