Capítulo 6: O Diário de Seu Zé

 A névoa engrossava ao entardecer, envolvendo a Ilha das Brumas em um manto cinzento que tornava o cais quase invisível. Higor, Henrique, Ana e Pedro corriam em direção ao barco de Seu Zé, desviando de destroços e vultos que se moviam na penumbra. O plano era simples: pegar o barco do Seu Manny não daria certo com os infectados tão perto do cais, então decidiram investigar o de Seu Zé primeiro — talvez ele tivesse algo que explicasse o pesadelo.

— Tá trancado? — perguntou Henrique, chutando a porta da cabine do barco assim que chegaram. A madeira rangeu, mas não cedeu.

— Deixa comigo — disse Pedro, ainda segurando o ombro ferido. Ele pegou uma barra de ferro enferrujada no convés e forçou a fechadura, que estalou com um som seco.

Os quatro entraram, o ar dentro da cabine cheirando a peixe podre e cachaça velha. A bagunça era evidente: redes rasgadas, garrafas quebradas, e um balde com restos de peixes prateados jogado no canto. Higor foi direto para uma mesa pequena, onde viu um caderno de capa preta, amarelado pelo tempo.

— É o diário dele — disse Higor, abrindo o caderno com cuidado. As páginas estavam cheias de rabiscos tortos, escritos com uma caneta que parecia ter falhado várias vezes. Ele leu em voz alta: — "Dia 18. Peguei um bicho estranho além do recife. Água preta, parada. Tinha algo vivo na rede, mexendo, mas cortei fora. Peixe vale ouro."— Algo vivo? — repetiu Ana, franzindo a testa. Ela se aproximou, pegando o diário das mãos de Higor. — Ele não fala o que era?

Higor virou a página, os olhos correndo pelas linhas.

— Aqui — disse ele, apontando. — "Dia 20. Mais peixes. Mesma água escura. Ouvi um barulho na rede, como um grito abafado. Joguei fora o que não era peixe. Ganho mais assim."— Ganância desgraçada — murmurou Henrique, chutando uma garrafa pelo chão. — Ele sabia que tinha algo errado e trouxe isso pra cá mesmo assim.

Ana pegou o diário de volta, examinando os rabiscos com um olhar atento.

— Essa água escura... pode ser um vazamento antigo — disse ela, a voz baixa. — Talvez um experimento que deu errado. Parasitas assim não aparecem do nada. Pode ser artificial, criado por alguém.

— Criado? — perguntou Pedro, os olhos arregalados. — Tipo uma arma?

— Talvez — respondeu Ana, fechando o diário. — Mas sem mais provas, é só teoria. Precisamos sair daqui e...

Um baque interrompeu as palavras dela. O barco balançou, e um gemido grave veio do lado de fora. Higor correu para a janela da cabine, o coração disparado. Na névoa, figuras lentas se aproximavam — infectados, pelo menos cinco, arrastando os pés pelo cais. Um deles, Seu Carlão, batia no casco com uma força desumana, os olhos brancos refletindo a luz fraca.

— Eles nos acharam! — gritou Henrique, agarrando a faca. — Como saímos agora?

— Pelo teto — disse Pedro, apontando para uma escotilha na cabine. — A gente sobe e pula pro outro lado do cais. O barco do Seu Manny tá logo ali.

Ana guardou o diário na mochila, enquanto Higor anotava rápido no seu caderno: "Diário do Seu Zé. Água escura. Algo vivo." Ele mal terminou quando outro baque sacudiu o barco, e a porta começou a rachar.

— Vamos! — gritou Ana, empurrando Pedro para a escotilha.

Os quatro subiram, o metal frio cortando as mãos. Lá fora, o som dos infectados era um coro de gemidos e batidas, cada vez mais perto. Eles estavam encurralados, e o mar, ao longe, parecia assistir em silêncio.