Capítulo 7: O Cerco

 O céu escurecia quando Higor, Henrique, Ana e Pedro pularam do barco de Seu Zé para o cais, a névoa engolindo seus passos. Os infectados os seguiram, lentos, mas implacáveis, os gemidos ecoando como um aviso. O barco do Seu Manny estava a poucos metros, mas o caminho estava bloqueado por mais vultos que emergiam da praia.

— Não vamos conseguir! — gritou Pedro, a voz rouca. — Eles tão vindo de todos os lados!

— Ali! — apontou Ana, indicando uma construção velha no topo de uma colina próxima. Era a igreja abandonada, um esqueleto de madeira e pedra que ninguém usava desde que Dona Lúcia construíra a nova. — É nossa melhor chance!

Eles correram, o chão úmido escorregando sob os pés. A porta da igreja estava entreaberta, e eles se jogaram para dentro, empurrando bancos velhos contra a entrada. O interior cheirava a mofo e sal, as janelas quebradas deixando entrar rajadas de vento frio.

— Isso não vai segurar por muito tempo — disse Henrique, ofegante, enquanto testava a barricada. — Eles vão derrubar tudo.

Higor foi até uma janela, espiando pela fresta. Os infectados se aproximavam, mas algo chamou sua atenção: eles paravam na beira da praia, os corpos tremendo enquanto olhavam para o mar. Um deles, Dona Rosa, caiu de joelhos e começou a lamber a areia molhada, como se buscasse algo.

— Eles querem a água — murmurou Higor, anotando no caderno. — Água salgada. É isso que tá puxando-os pra costa.

— O parasita — disse Ana, juntando-se a ele. — Deve mexer com o cérebro, criar uma obsessão. Por isso os ataques são mais fortes perto do mar.— Então a gente fica aqui — sugeriu Pedro, encostado na parede. — Longe da água, eles não vêm, certo?

Antes que alguém pudesse responder, um ruído veio da porta dos fundos da igreja — um arrastar lento, seguido por um gemido baixo. Henrique virou-se, a faca levantada, mas congelou ao ver quem era. Clara, a mãe deles, entrou cambaleando, os olhos brancos brilhando na penumbra. O vestido florido estava rasgado, e suas mãos tremiam, esticadas na direção dos filhos.

— Mãe? — chamou Henrique, a voz falhando. Ele deu um passo à frente, mas Ana o segurou pelo braço.

— Ela não é mais sua mãe — disse Ana, os olhos arregalados. — Olha pra ela, Henrique!

Clara avançou, um rosnado escapando dos lábios. Ela agarrou o braço de Henrique, as unhas cravando na pele, e ele gritou, tentando se soltar. Higor pegou uma barra de ferro enferrujada do chão, o coração disparado.

— Me solta, mãe! — implorou Henrique, empurrando-a com a mão livre.

Higor hesitou, os olhos marejados, mas então golpeou. A barra acertou o ombro de Clara, e ela caiu com um gemido, soltando Henrique. Ele recuou, o braço sangrando, enquanto Clara se arrastava no chão, os olhos fixos nele.

— Desculpa, mãe — sussurrou Higor, a barra caindo das mãos. Ele virou o rosto, incapaz de olhar enquanto Ana e Pedro a empurravam para fora, trancando a porta dos fundos.

Henrique caiu de joelhos, o rosto enterrado nas mãos.

— Era ela, Higor — disse ele, a voz embargada. — Era nossa mãe.

— Não era mais — respondeu Higor, a voz tremendo. Ele pegou o caderno e escreveu com mãos trêmulas: "Mãe infectada. Tentou me matar. Água salgada os atrai." Mas as palavras não diminuíam a dor.

Lá fora, os golpes na porta principal começaram, lentos e insistentes. O cerco havia começado, e a igreja, por mais frágil que fosse, era tudo o que os separava do caos.