A geração Z e o sonho da casa própria



A geração Z, nascida entre meados dos anos 1990 e início dos 2010, enfrenta um cenário econômico e profissional radicalmente diferente das gerações anteriores, o que está redefinindo seus sonhos e prioridades. Um dos maiores símbolos de estabilidade no passado, a casa própria, vem perdendo espaço em meio a desafios estruturais. Empresas, especialmente em setores como tecnologia e serviços, adotaram modelos organizacionais mais horizontais, reduzindo níveis hierárquicos para ganhar agilidade e cortar custos. Embora isso promova um ambiente menos burocrático, também diminui as oportunidades de ascensão profissional. Para jovens que ingressam no mercado, a escassez de cargos intermediários e a valorização de habilidades multifuncionais tornam difícil a progressão tradicional, limitando aumentos salariais significativos e a construção de um patrimônio a longo prazo.

Paralelamente, o mercado imobiliário vive uma alta expressiva, impulsionada por fatores como especulação, demanda reprimida e custos de construção elevados. Em grandes centros urbanos, os preços dos imóveis dispararam, enquanto salários não acompanharam esse ritmo. Para muitos da geração Z, que já lidam com insegurança financeira, contratos temporários e a cultura do job hopping, economizar para um financiamento imobiliário tornou-se quase utópico. Dados do Banco Central revelam que, nos últimos dez anos, os imóveis residenciais subiram acima da inflação, ampliando o abismo entre renda e acesso à moradia. A combinação entre estagnação salarial e custos elevados faz com que até mesmo o aluguel consuma parte expressiva da renda, relegando o sonho da casa própria a um plano distante.

Diante desse cenário, a geração Z está reavaliando suas ambições. Prioridades como qualidade de vida, experiências e liberdade geográfica ganham força. Muitos optam por investir em viagens, educação continuada ou projetos pessoais, enxergando nisso um retorno mais tangível do que um compromisso de décadas com um financiamento imobiliário. A ascensão do trabalho remoto também alimenta essa tendência: sem a necessidade de fixar residência em polos urbanos caros, parte dessa geração migra para cidades menores ou até mesmo para o exterior, buscando custos menores e estilo de vida flexível. A ideia de “lar” se desconstrói, substituída por conceitos como co-living e mobilidade.


Além disso, valores dessa geração reforçam a mudança de foco. Preocupações com sustentabilidade, por exemplo, levam muitos a questionar o consumismo associado à propriedade, enquanto a busca por propósito faz com que estabilidade financeira não seja mais o único parâmetro de sucesso. Redes sociais e a cultura digital também amplificam modelos alternativos de realização, onde independência e autenticidade são mais valorizadas do que bens materiais. Não se trata de desistir do sonho, mas de ressignificá-lo: em vez de enraizar-se em um imóvel, a geração Z prefere investir em liberdade para redesenhar o futuro em um mundo incerto.


O resultado é um choque entre estruturas econômicas ultrapassadas e novas expectativas. Enquanto governos e empresas não repensarem políticas de habitação e carreira, a casa própria seguirá como um ideal inalcançável para muitos. A geração Z, porém, parece decidida a não esperar: cria seus próprios caminhos, transformando frustrações sistêmicas em motivação para buscar formas inéditas de viver — e sonhar.