Naquela manhã chuvosa, ela estava parada na esquina, tentando equilibrar as sacolas enquanto procurava um guarda-chuva na bolsa. As pessoas passavam apressadas, desviando das poças e da pressa. Eu quase fiz o mesmo, mas alguma coisa me fez parar.
Ofereci ajuda. Peguei parte das sacolas, atravessei com ela até o outro lado da rua. Ela agradeceu com um sorriso curto, desses que parecem tímidos, mas carregam um cansaço bonito. Depois, cada um seguiu o seu caminho.
Não pensei mais nisso até alguns dias depois, quando precisei pegar um ônibus e percebi que a motorista esperou eu correr até o ponto antes de fechar a porta. Ela sorriu também. E, naquele sorriso, senti o mesmo calor discreto daquela manhã chuvosa.
Foi ali que percebi: a gentileza volta, mesmo quando a gente não espera.
Pode demorar, pode vir de outra pessoa, pode até chegar de um jeito que nem parece resposta, mas ela sempre encontra o caminho.
A vida tem um jeito misterioso de devolver o que colocamos no mundo. Nem sempre na mesma medida, mas com a mesma intenção. É como se cada gesto, por menor que seja, criasse um eco silencioso que continua se espalhando.
A gentileza é leve, mas deixa marcas profundas.
Ela muda o ritmo dos dias, suaviza os encontros e, às vezes, salva alguém sem que a gente perceba.
Ser gentil não é ser ingênuo. É escolher, em meio ao caos, continuar acreditando que a delicadeza faz sentido.
Talvez a gentileza não precise ser lembrada para continuar existindo.
Basta que alguém, em algum momento, se lembre de agir com o coração aberto.
Porque o bem que a gente faz nunca se perde.
Ele apenas dá a volta no mundo antes de voltar pra casa.
